Disclaimers: Esta fic se passa na França, entre Paris
e Reims, região produtora de champagne e vinhos a mais ou menos cento
e oitenta quilômetros a nordeste de Paris. |
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– Não, Fran! Não posso acreditar! Isso tudo não faz sentido algum! Como Claire poderia estar me traindo? – Julianne sentia-se paralisada pelo que acabava de ouvir.
– Não estamos brincando com você, Juli. Nós vimos! Tiramos fotos!
– E onde estão essas fotos? – ela perguntou, trêmula.
– Bárbara foi imprimi-las. Estão no nosso arquivo pessoal – Françoise respirou fundo: não queria ser ela a contar aquele tipo de coisa para sua amiga, mas não houve outro jeito; não deixaria que ela fosse enganada. Ficou olhando-a cheia de tristeza, enquanto via-a rodar nervosamente no dedo anular esquerdo, a aliança de casamento.
Ela e Bárbara tinham chamado Julianne para uma conversa que preferiam jamais ter. Eram amigas há muitos anos e depois do que presenciaram por acaso no estacionamento da Sorbonne, onde trabalhavam, não poderiam se calar. Sabiam que Julianne era apaixonada por Claire; tinham sido as convidadas de honra no casamento delas há dois anos atrás, mas nunca se sentiram amigas dela como se sentiam de Julianne. Conviviam com Claire pelos corredores da Faculdade de História, onde ela também dava aulas, e já tinham percebido que ela costumava flertar com outras professoras e também alunas, mas nunca pensaram que ela seria capaz de trair Julianne.
Na semana anterior, ela e Bárbara estavam no restaurante da faculdade e viram quando Claire saiu de mãos dadas com uma aluna e foi em direção ao estacionamento. Por não saberem se se tratava de uma pessoa íntima de Claire, não deram importância ao fato, até pagarem a conta e irem pegar o carro no estacionamento.
Foi Françoise quem viu: Claire Barnard estava aos beijos com a moça; ambas encostadas no carro dela, em plena hora do almoço.
“– Babi, o... olhe aquilo!” – ela lembrou de ter gaguejado para Bárbara.
“– Mas, não é...”
“– ...Claire!” – Fran completou, incrédula.
Pasmas com a cena, ficaram paradas por alguns segundos. Ela não as vira, e continuava o seu espetáculo de traição para quem quer que passasse pelo estacionamento.
“– Como ela pode fazer isso com Juli? Canalha!” – Françoise sentiu a raiva invadi-la, sem saber direito o que fazer ou pensar.
Mas por sorte, Bárbara lembrara-se do objeto que ajudaria a desmascarar Claire e deixa-la sem qualquer argumento:
“– Fran, a câmera!”
“– Que câmera?”
“– A nossa câmera fotográfica! Está na minha mochila; dentro do carro!”
Abrindo um sorriso de satisfação ao saber que Julianne não seria mais enganada, Fran abrira o carro e de dentro dele mesmo, fizera as fotos que agora Bárbara trazia do escritório e colocava nas mãos de Julianne.
As fotos digitais não deixavam dúvidas de quem era uma das mulheres naquelas imagens. Os olhos azuis de Julianne encheram-se de lágrimas, enquanto o tremor em suas pernas a fez sentar-se para não cair.
– Oh, meu Deus! – ela conseguiu balbuciar baixinho.
– Sentimos muito, Juli.
Fran e Babi sentaram-se na poltrona oposta a ela, em silêncio. Sabiam o quanto sua amiga estava sofrendo. Entreolharam-se, desejando que ela saísse ferida o menos &iaííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííute;ossível daquilo tudo.
Desviando os olhos vermelhos das fotos, Julianne lutava para não chorar. Era uma mulher forte e não admitiria chorar por alguém que a traíra.
– Quando foi isso? – perguntou angustiada.
– Semana passada. Pensamos muito no que fazer com elas depois que as tiramos. Fizemos por impulso, mas depois...
– Vocês fizeram bem em me mostrar. Se um dia eu descobrisse por outra pessoa, não as perdoaria. – ela respondeu, com o olhar duro de quem tem o coração cheio de mágoa.
– Ainda não temos certeza se fizemos o que era certo. – Babi respondeu. – Queremos que você fique bem; ou pelo menos tente ficar...
– Acabei de descobrir que meu casamento era uma farsa, Babi! Claire e eu nos conhecemos há cinco anos e estamos casadas há dois. Quando decidi me casar com ela estava apaixonada e achava que seria feliz. Eu confiava nela e nunca me passou pela cabeça que ela poderia...
Ela calou-se. Sua mágoa não permitia que continuasse falando. Levantando-se, foi até a janela do apartamento e ficou em silêncio por muito tempo, olhando as luzes noturnas’ através da janela. Sentia tudo ruir à sua volta. Pensou na casa, na mobília ainda nova que ela e Claire escolheram juntas; nas muitas vezes que escolhia um vinho especial e ia para casa mais cedo apenas para fazer uma surpresa e preparar o que ela gostava de comer.
“Como ela pôde?” – a pergunta martelava em sua cabeça infinitas vezes.
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Indo para casa naquela noite, Julianne tentou pensar no que faria. Apesar do frio, dirigiu sem luvas: estava anestesiada pela raiva; suas mãos tremiam, e ela sentia que precisava se acalmar antes de encontrar Claire.
Quando entrou pela porta que vinha da garagem, viu Claire mexendo em algo na cozinha. Lembrou que provavelmente aquelas traições deviam estar acontecendo há muito tempo e sem conseguir evitar, pensou em quantas vezes Claire teria ido para a cama com outra e depois vindo para casa e agido normalmente. Sentiu nojo dela. Tinha feito o juramento de ama-la por toda a vida, mas agora não suportava a menção daquele nome traidor.
Deixando suas coisas sobre o aparador e ficando apenas com o envelope com as fotos na mão, ouviu com desprezo quando Claire a chamou:
– É você, amor?
– Como ela pode ser tão cínica? – Julianne murmurou para si, contraindo o rosto, cheia de mágoa e raiva.
Ela não respondeu imediatamente, e em silêncio, entrou na cozinha e jogou o envelope sobre a mesa.
Claire olhou-a sem entender:
– O que é isso? – Claire perguntou.
– São fotos. – Julianne respondeu séria. – Veja se você se reconhece nelas com eu a reconheci. – a voz dela soou tão cheia de sarcasmo e desprezo, que Claire soube imediatamente que algo estava errado.
Ela pegou o envelope e abriu-o devagar. A constatação de que fora flagrada era inegável e ela empalideceu visivelmente, antes de desviar o olhar das fotos e não conseguir encarar Julianne.
– Juli, eu... – ela gaguejou.
– Não tente se explicar, Claire. Ficará pior. – Julianne interrompeu-a, com a voz cortante e fria. – Estou indo para um hotel. Amanhã meu advogado vai procurar você para providenciarmos nossa separação.
– Mas, querida...
– Nunca! Jamais me chame disso outra vez! Não sou sua querida! Talvez nunca tenha sido! – ela gritou, explodindo sua raiva e esmurrando a mesa, sem se conter mais. E antes que Claire tivesse tempo para pensar, ela bateu a porta e saiu daquela casa e da vida da mulher que trocara seu amor por uma aventura inconseqüente.
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Um ano depois...
A luz fraca do interior da adega atravessou o finíssimo cristal e deixou que o vermelho brilhante de mais uma excelente safra de vinhos se revelasse para um atento par de olhos azuis.
Com um sorriso de satisfação, a bela mulher anotou a cor do lote que examinava numa prancheta e balançou levemente a taça, antes de leva-la próxima ao nariz e aspirar o delicioso bouquet, para em seguida provar um gole mínimo.
– Perfeito!
Julianne de Laet era a herdeira e a enóloga responsável pela respeitada Maison de Laet, vinícola fundada há mais de dois séculos por sua família, e que era conhecida como uma das melhores maisons de vinhos da França. E aquele era seu trabalho.
Julianne era uma mulher magnífica. Os mais de 1,80m lhe davam um ar imponente e sedutor ao mesmo tempo, enquanto os ombros largos se deixavam emoldurar por uma cascata negra de lindos cabelos lisos. O rosto forte de maçãs altas chegava à perfeição com os olhos pequenos e absolutamente azuis, que eram capazes de tirar o fôlego de qualquer um que os encarasse.
Ela fazia questão de acompanhar a qualidade de cada safra desde a colheita e estava ali, fazendo a degustação de vários lotes por quase todo o dia, quando um dos funcionários chegou correndo pela penumbra dentre os barris de carvalho com o celular dela na mão.
– Mademoiselle Julianne... sua amiga... Bárbara... – ele falou, quase sem fôlego.
– Jean, por que não disse a ela que eu ligaria mais tarde?
– Eu disse, mas ela insistiu. Avisei que mademoiselle estava sem o celular e ela me pediu para trazê-lo até aqui. Disse que precisava falar-lhe com urgência. – ele respondeu.
Rindo do afobamento dele, ela agradeceu e pegou o celular. Já ia dar uma bronca em Babi, quando ouviu a voz de Françoise do outro lado da linha:
– Juli? Sou eu, Fran!
Julianne sabia o que significava ser Françoise e não Bárbara no telefone.
– Ah, não, Françoise! Você não vai insistir naquele assunto de novo! Eu já disse que não vou. Não quero conhecer ninguém! Eu não acredito que você fez Jean correr até aqui para me falar sobre isso de novo!
– Juli, querida, ouça: eu e Bárbara não queremos que você passe sua vida enfurnada entre esses barris de vinho. Não custa nada você nos acompanhar à palestra. Helen Adler-Wright é uma das arqueólogas mais renomadas dos Estados Unidos e eu a conheço há mais de cinco anos. Fizemos nossos doutorados juntas em Chicago. Tenho certeza de que você não perderá nada em conhecê-la.
– Nunca tive problemas em conhecer pessoas, Fran. Meu único problema é com esse seu tom de “alcoviteira” na voz, todas as vezes que me falou dessa arqueóloga!
– Julianne! – a outra fingiu espanto.
– É isso mesmo! Você está tentando me casar de novo e eu não pretendo fazer isso tão cedo, seja com quem for!
– Está bem! Está bem! – Fran recuou, sabendo que se insistisse, jamais conseguiria fazer Julianne aparecer naquela palestra. – Então pelo menos assista à palestra conosco. Prometo não falar mais sobre isso. Você e Helen podem ser amigas, não podem? E queremos que você saia um pouco. Sei que você gosta de se enfiar nesses becos escuros, mas não precisa exagerar, não é? Esses magníficos olhos azuis foram feitos para o deleite das mulheres e não para se esconderem no escuro!
– Ora, Françoise...
Vendo satisfeita que conseguira encabular Julianne, ela aproveitou o momento para dar um ultimato à amiga:
– Esperamos você em Paris amanhã à tarde. A palestra começa as seis da tarde, no Auditório 2. – e desligou.
Julianne ficou parada com o celular na mão. Acabou rindo da situação: desde que terminara seu casamento com Claire, Fran vivia arranjando motivos para apresentar-lhe alguém. Já fazia um ano e ela não sentia a menor necessidade de ter uma namorada, mas a insistência da amiga, que no começo a irritava, agora estava fazendo-a rir. Ela e Babi foram seu maior apoio quando tudo desabou sobre ela; deram uma força que Julianne jamais seria capaz de agradecer o suficiente e queriam vê-la feliz. Por isso não se irritava mais e ficava apenas tentando se livrar dos “encontros” que elas arranjavam.
Ela vestiu seu casaco de lã grossa e saiu para o frio das videiras que cercavam o galpão subterrâneo onde estava. Caminhou pela pequena estrada até chegar ao pé da colina onde ficava o castelo do século XVII e em anexo, a sede da vinícola. Olhou orgulhosa para as plantações que se perdiam de vista, contrastando seu verde escuro com o azul do céu frio e sem nuvens. Aquelas colinas na região de Reims eram o seu lugar. Fôra morar em Paris para estudar Enologia, como todos de sua família, mas sempre que podia, voltava para o “seu castelo”, que seu pai havia reformado e reestruturado, deixando-o o mais aconchegante possível.
Ouvindo um carro que se aproximava, continuou seu caminho e viu com alegria que eram seus pais que chegavam.
Geraldine e Phillipe de Laet desceram do carro e foram ao encontro da filha única. Julianne era o orgulho deles; herdara a beleza refinada de sua mãe e o amor pelos vinhos que fizera de seu pai um dos enólogos mais conhecidos e respeitados da França.
E ela não fazia por desmerecer a tão preciosa herança que recebera: cuidava da empresa com a mesma perspicácia que reconhecia uma safra especial através do vermelho intenso dos vinhos que analisava.
– Julianne! Que bom encontra-la em casa, filha! – sua mãe abraçou-a, enchendo-a de beijos por todo o rosto, como fazia desde que ela era criança.
– Geraldine! Julianne sempre está aqui quando chegamos. Isso acontece desde que ela voltou a morar conosco no ano passado! – Phillipe repreendeu suavemente a esposa, em tom de brincadeira.
– Querido, eu sei disso. É que adoro encontra-la toda vez que chegamos!
– Vocês dois perceberam que estamos congelando aqui fora nesse vento, enquanto discutem? – Julianne interrompeu-os, rindo daquela velha implicância, que apesar de parecer que estavam discutindo, não passava do jeito deles discordarem propositalmente de algo.
– Você está certa, filha. Venham minhas queridas, vamos entrar. – disse o pai dela, colocando-se entre elas e oferecendo gentilmente o braço às duas.
Acompanhando seus pais até uma das amplas salas de estar, Julianne sentou-se em uma poltrona enquanto observava seu pai indo até o bar e fazendo o que ela o vira fazer a vida toda: abrir uma garrafa de chardonnay e sentar-se com a mulher e a filha para saborear o vinho antes de jantarem juntos.
Lembrou-se do quanto relutara em voltar a morar em Reims quando se separara de Claire. Tinha morado fora desde a faculdade e achava que não se adaptaria a dividir sua intimidade com seus pais novamente. Mas ela se surpreendera com a cumplicidade que conseguira retomar com eles quando voltara para casa. Eles estiveram dispostos a conversar quando ela precisou e também deixaram-na sozinha nas horas em que isso era necessário. Queriam vê-la feliz, apesar de saberem que demoraria um pouco até que ela superasse o que Claire fizera; e como todos os pais, ficaram radiantes ao terem sua filha novamente sob as asas.
Lembrou-se do compromisso com suas amigas e resolveu avisar seus pais antes que eles planejassem qualquer coisa para o dia seguinte.
– Papá, Mamã, vocês ficarão aqui no final de semana ou vão a Paris?
– Ficaremos em casa, ma cherie. Por quê? – sua mãe quis saber.
– Vocês se importam se eu for a Paris amanhã?
– Claro que não, querida! Mas o que irá fazer por lá?
– Fran e Babi querem que eu vá a uma palestra sobre arqueologia com elas. Será amanhã à noite, mas voltarei no sábado.
Em sua intuição materna, Geraldine percebeu que não era apenas aquilo. Conhecia Françoise e Bárbara o suficiente para saber que não estariam arrastando Julianne para uma palestra sobre arqueologia apenas para saciar o interesse de sua filha por arqueologia; o que ela sabia ser absolutamente nulo.
– Julianne, Françoise está tentando lhe apresentar alguém novamente?
Surpreendida pela pergunta, Julianne ficou em silêncio por alguns segundos, tentando imaginar como sua mãe acertara a questão com tão poucas informações.
– Bem... na verdade está, mamã. – ela confessou, sabendo não ser necessário esconder isso de sua mãe, já que ela e seu pai sempre souberam de todas as tentativas de Fran em apresentar-lhe alguém.
– E por que você não se permite conhecer essa moça, filha? Já se passou um bom tempo... Tenho certeza que Fran e Babi não lhe apresentariam alguém que não fosse merecedora de tal confiança da parte delas. São suas amigas, ma cherie. Provaram isso da forma mais leal possível. E se você me permite dizer, penso que seria ótimo você ter uma nova companheira. Você tem ficado muito sozinha.
Olhando para sua mãe, Julianne sentiu o coração enternecido pelas palavras dela. Seu pai a olhava em silêncio, mas sabia que ele também pensava da mesma maneira; ambos queriam vê-la feliz. Tinham sofrido quase tanto quanto ela quando Claire quebrara o juramento que havia feito.
Ela percebia que suas amigas e mesmo seus pais queriam a todo custo arranca-la da solidão que ela própria estava se impondo, mas estava convicta da resolução que tomara; e olhando novamente para sua mãe, depois de observar pensativamente a taça que tinha nas mãos, respondeu:
– Sei que vocês querem me ver feliz, mas por enquanto não admitirei outra mulher na minha vida. Estou indo a Paris apenas para agradar Fran e Babi, pois elas também se preocupam comigo. Nesse momento da minha vida, não sou capaz de acreditar novamente em alguém.
– Oh, filha... – sua mãe lamentou. – Não quero vê-la tão descrente das pessoas por causa do que aconteceu! Isso não significa que outra pessoa fará o mesmo, querida!
– Eu sei. – Julianne respondeu, em meio a um sorriso entristecido. – Mas não posso ignorar o que sinto, mamã.
– Mesmo assim, eu gostaria, e creio que seu pai também, que você mudasse de idéia ao conhecer essa moça.
Julianne apenas sorriu, preferindo não responder. Todos à sua volta pareciam estar se unindo contra a solidão que ela própria escolhera. No fundo sentia-se feliz por ser tão querida, mas ainda preferia não abrir mão da decisão que tomara.
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Olhando a cidade através da janela do avião, Julianne sentiu-se feliz por estar novamente em Paris depois daquelas semanas trabalhando na vinícola. No meio de dezembro, ela tirara uma pequena licença das atividades do doutorado e fora para Reims com a intenção de ficar um pouco mais de tempo com seus pais; além de passar as festas de fim de ano com eles.
Agora, de volta e indo reencontrar suas amigas, ela sentia-se bem, apenas sentindo um leve desconforto com aquela história de Fran querer que ela conhecesse a tal amiga americana. Lembrou-se da promessa dela em não tocar mais naquele assunto, mas como conhecia Françoise muito bem, ainda tinha suas dúvidas. Estava indo à palestra pela insistência dela; para não chatea-la, mas se pudesse escolher, iria ao Café Jussieu tomar seu querido café expresso e não à Faculdade de História como teria de fazer.
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Vendo as construções imponentes da Sorbonne, ela instruiu o motorista do táxi até os prédios que abrigavam as faculdades de História e Filosofia. Aquela parte da universidade era uma das mais antigas, e a arquitetura medieval encaixava-se perfeitamente entre os jardins bem cuidados.
Rindo, Julianne lembrou-se do dia em que elogiara Fran, dizendo que ela tinha “a cara da faculdade” e ela ficara furiosa porque Julianne a tinha chamado de “velha”:
– Fran, estou dizendo que você se parece com a faculdade porque trabalha aqui! As pessoas costumam se parecer com quem amam e também com os lugares onde passam a maior parte do seu tempo!
Julianne tentara se explicar; não conseguindo muita coisa. Ela achava incrível como Fran se ofendia por qualquer coisa. No fundo não era sério, pois ela logo esquecia, mas às vezes ficava preocupada com as mágoas dela. Rindo, ela recordou as situações dificílimas em que Bárbara às vezes se metia por não medir com cuidado o que falava para a namorada.
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O táxi deixou-a na entrada do pavilhão e ela caminhou até o Auditório 2. Ela não viu Babi e Fran e achou melhor espera-las na ante-sala do auditório, pois o frio ali fora ficaria insuportável depois de alguns minutos. Apesar dos seus trinta e cinco anos, Julianne não conseguia se lembrar de um inverno tão rigoroso quanto aquele em Paris.
Andando pelo imenso salão, encontrou alguns amigos seus e também alguns professores da época da faculdade. E caminhando entre as pessoas, ela viu o cartaz que anunciava a palestra da arqueóloga americana especializada em culturas pré-colombianas.
“Ela deve ser muito boa no que faz. Muitos dos principais professores de toda a universidade estão aqui hoje.” – ela pensou, admirada pela qualidade e quantidade de pessoas que já formavam uma pequena fila na entrada do auditório.
Olhando o relógio, ela viu que eram seis e cinco. Dentro do auditório já estavam fazendo a apresentação da palestrante, quando Fran e Babi chegaram apressadas.
– Oh, Juli! Perdoe-nos, mas nos atrasamos. Como você está, querida? Sentimos tanto a sua falta! – Fran foi perguntando enquanto abraçava Julianne efusivamente.
– Estou ótima! E vocês?
– Congelando! – Babi respondeu rindo e esfregando as mãos na tentativa de se aquecer.
– Amor, vamos entrar! Acho que já está começando. Venha Juli. – Fran dirigiu-se às duas, enquanto puxava Bárbara pela mão.
Julianne olhou-as com ternura; era uma alegria para ela ver as duas amigas juntas e tão apaixonadas. Eram um dos poucos casais, conhecidos seus, que se respeitavam e se amavam tanto.
Entraram no auditório praticamente cheio e sentaram-se numa das últimas fileiras. O mestre de cerimônia terminou de apresentar a palestrante naquele momento e chamou-a para que ela começasse.
Distraída, Julianne não viu quando ela levantou-se da primeira fila de cadeiras e foi até o tablado. Conversando com Babi, que sentara ao seu lado, ela sentiu apenas que todos os seus sentidos se aguçaram quando a voz macia e ligeiramente grave soou nos auto-falantes do auditório.
Voltando-se instintivamente em direção àquele timbre perfeito, Julianne viu uma mulher vestida num taileur impecável; os cabelos louros e bem cortados caíam-lhe pela testa, quase chegando aos ombros. Não era alta, mas era dona de uma altivez e de uma elegância únicas. A pele clara estava ligeiramente queimada de sol, provavelmente pelos trabalhos de campo que ela havia realizado recentemente em escavações na América Latina; e que Julianne já sabia de cor, tanta foi a insistência com que Françoise lhe falou dela.
– Oh, lá está Helen, Bárbara! Pena que chegamos tão atrasadas! Teremos de esperar até o final para que eu lhe apresente a ela! Tenho certeza de que ela vai adorar você! – Fran exclamou, entusiasmada com a presença da amiga e interrompendo os pensamentos de Julianne.
– Juli, tenho certeza de que você também vai adorar a Helen! Ela é uma amiga e tanto! – Fran repetiu, agora se dirigindo a Julianne.
– Eu não sabia que Babi também não a conhecia.
– Não, não conheço. Eu falo com ela de vez em quando por telefone, mas Fran é quem tem mais contato com ela. É a primeira vez que Helen vem a Paris e nós nunca pudemos ir a Chicago para vê-la; ou a uma das escavações por onde ela andou. – Baby respondeu rindo.
Julianne voltou-se e ficou assistindo à palestra em silêncio. Longe como estava, numa das últimas cadeiras do auditório, não conseguia ver direito como era a tal arqueóloga, mas percebia que era uma mulher muito bonita. Pela voz que soava nos auto-falantes, sabia que se tratava de uma mulher inteligente e perspicaz. Poderia facilmente se tornar amiga de uma mulher com aquelas qualidades, mas para ela a proposta de Fran em apresenta-las insinuando um interesse estava completamente fora de questão.
Ela não queria namorar, casar, ou qualquer outra coisa nesse sentido. Não tinha a intenção de passar o resto da vida sozinha, mas naquele momento, estava decidida a ficar só.
Ficou satisfeita com ver que Françoise não insistia mais no assunto. Pelo que conhecia dela, sabia que nem estaria conseguindo assistir à palestra tamanha seria a lista de qualidades da amiga que Fran estaria lhe passando.
Ela lhe apresentaria a Helen, claro, mas pareceu que Fran resolvera respeitar sua vontade de apenas conhece-la e não ser apresentada com o intuito de que houvesse algo mais.
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Uma hora depois, o auditório aplaudia o final da palestra.
Julianne ficou admirada com o trabalho que ela desenvolvia apenas em ouvi-la falar dele. Seu entusiasmo era tanto e a maneira como falou foi tão envolvente, que ninguém deixou o auditório antes dela terminar.
Françoise achou melhor esperar que a maioria das pessoas saísse para ir até sua amiga. E isso ainda demorou um pouco, pois várias pessoas fizeram questão de cumprimenta-la.
Quando as últimas pessoas se dispersaram e Françoise aproximou-se de Helen, trazendo-a até Julianne e Babi para apresenta-la, Julianne sentiu que o magnetismo dela não ficava só na voz: o andar macio trouxe até ela uma mulher exuberante dos pés à cabeça.
Helen Adler-Wright simplesmente impressionava. Julianne a tinha visto de longe, mas de perto os contornos perfeitos do rosto e os olhos intensamente verdes mostravam o quanto ela era linda. O tailleur escuro lhe caía perfeitamente, mostrando um corpo desenhado em curvas bem feitas.
Inegavelmente admirada, ela assistiu Françoise apresentando a bela arqueóloga à Bárbara.
– Babi, esta é Helen! – Fran apresentou-a, entusiasmada. – Helen, esta é minha querida Bárbara.
– Muito prazer, Bárbara! Demorou, mas nos conhecemos finalmente, não é? – Helen respondeu sorrindo, enquanto apertava a mão de Bárbara.
– É mesmo! Já estava querendo que você viesse logo para conhece-la! – Babi respondeu.
– E esta é Julianne de Laet, aquela amiga de quem também lhe falei.
– Oi, Julianne. Ouvi muito sobre você e seus maravilhosos vinhos. É um prazer conhece-la!
– Como vai, Helen! Seja bem-vinda a Paris.
Estendendo a mão para ela, Julianne respondeu ao cumprimento e não teve tempo de sentir raiva de Fran, que provavelmente havia feito a Helen os mesmos comentários que fizera com ela. Foi como uma peça que o destino quis pregar: quando os olhos delas se encontraram, ambas sentiram a intensidade da atração mútua que tomou conta das duas.
Foi algo que não estava previsto para elas. As duas mulheres mergulharam involuntariamente no olhar uma da outra, sentindo o efeito e a intensidade disso no arrepio que começou no toque de suas mãos. Era como uma força sem controle a invadi-las e obrigar cada uma a reconhecer o que estava acontecendo.
E foi como se um baque imprevisível e inevitável atingisse Julianne. Parecia que tudo que tinha dito a respeito daquele encontro estava se contradizendo por vontade própria: Julianne não queria, mas a pele macia daquela mulher, em contato com sua mão, fez seu corpo arrepiar-se inteiro, como há muito tempo não acontecia. A última coisa que pensava acontecer era que se sentiria atraída por Helen. Tinha rejeitado aquela idéia de Fran desde o primeiro momento, mas diante do verde impressionante daqueles olhos, sentia-se incapaz de negar seu desejo.
Tentando ignorar o que sentiu, ela desfez educadamente o aperto de mão, enquanto lutava interiormente com suas convicções. A sensualidade de Helen não lhe passava despercebida, mas recusava-se a vê-la como alguém além de uma provável amiga.
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Helen percorreu instintivamente o contorno dos lábios de Julianne com o olhar. Não era de seu feitio agir assim quando conhecia uma mulher, mas com Julianne à sua frente, não conseguiu controlar seus olhos. Fran havia lhe falado que queria apresentar-lhe uma amiga que como ela, estava solteira há mais de um ano, mas apesar da descrição minuciosa dela, nunca teria imaginado que Julianne fosse tão extraordinariamente perfeita quanto ela estava vendo naquele momento. Ela era alta, e emanava uma imponência que os cabelos lisos e escuros só faziam aumentar ao cair pelos ombros largos. Os olhos azuis atraíam os seus de uma maneira que não conseguia controlar.
Quando Fran lhe falara sobre ela, não ficara interessada, pois estava terminando um programa de várias palestras depois de concluídas as escavações e só pensava em descansar um pouco. Depois do doutorado tinha mergulhado no trabalho e passava muito tempo nas viagens. Isso acabou afastando qualquer candidata a namorada e ela se deixou ficar na solidão, sem sentir falta de uma companhia.
Mas naquele momento estava diante de uma mulher que conseguiu despertar nela o que por muito tempo tinha ficado adormecido. A beleza de Julianne fazia-a sentir um desejo quase incontrolável de chegar bem perto dela e sentir-lhe o perfume, tocar aquele corpo esguio e beija-la devagar. Sua vontade era deslizar os dedos por entre aqueles cabelos negros e trazer os lábios dela até os seus.
Ciente de que as três perceberiam seu fascínio e lembrando-se do que Fran dissera sobre Julianne não querer qualquer envolvimento, ela sorriu tentando disfarçar seu embaraço e perguntou às três:
– E então? O que acharam da palestra?
– Excelente, Helen! Eu nunca me interessei por arqueologia, mas confesso que fiquei fascinada por seu trabalho! – Babi respondeu.
– Também gostei muito, Helen! Até parece que agora entendo de arqueologia! – foi a vez de Julianne responder.
As quatro riram com a brincadeira, enquanto Françoise percebia que havia acertado ao confiar em sua intuição: a atração que ela apostou que existiria entre suas mais queridas amigas estava concretizada.
“Agora é só uma questão de tempo.” – pensou.
Ela conhecia Helen e Julianne muito bem. Ambas estavam sozinhas há um bom tempo; Helen sem querer e Julianne voluntariamente. De alguma forma inexplicável ela sabia que se sentiriam atraídas. Bárbara não concordava com ela, achando que seria inútil a tentativa de apresenta-las, mas resolvera não desistir. Ainda mais quando Helen confirmou que viria a Paris logo no começo do ano.
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Quando entraram no carro, ela lançou um olhar de vitória para Bárbara, pois sabia que ela também tinha percebido. E olhando para suas passageiras no banco de trás, comunicou-lhes com ar solene:
– Minhas queridas, hoje é um dia muito especial para mim! Tenho uma linda mulher a quem amo muito e minhas mais queridas amigas também estão aqui! Quero leva-las para jantar; e se vocês me permitem sugerir, acho que o Magnific é perfeito para comemorar a vinda de Helen a Paris.
– É uma ótima idéia! O que acha, Juli? – Bárbara perguntou.
– Ótimo! Helen vai gostar. E faz meses que não vou lá!
E o que tem de especial nesse lugar? – Helen perguntou curiosa.
– Oh, é um maravilhoso restaurante que conhecemos, Helen! – Françoise se adiantou. – A dona é nossa amiga, a clientela é quase toda feminina e os pratos são ótimos.
– Bem, acho que um lugar para ficarmos à vontade seria muito bom. – ela concordou.
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Era sexta-feira e como um típico restaurante do Marais, o lugar estava quase cheio. A maitresse levou-as até uma mesa mais afastada do burburinho e reconhecendo as três, principalmente Julianne, que era cliente há muito tempo, antecipou-se:
– Posso sugerir sua escolha de sempre às suas amigas, mademoiselle?
Sem saber se todas concordavam com o pedido, ela olhou interrogativamente para as mulheres à sua frente.
– Bem, eu não sei...
– Oh, Julianne, seria uma excelente idéia que Helen provasse uma safra especial da Maison de Laet! O que acha, Helen? – Françoise adiantou a pergunta para a convidada principal.
– Eu adoraria, Julianne! Fran me contou bastante sobre seu trabalho e posso dizer que só com o que ela me falou, confio na sua escolha.
Encabulada com a intensidade que Helen colocou nos olhos ao falar com ela, Julianne desviou o olhar e confirmou para a maitresse que tomariam um merlot.
Logo elas entrosaram-se numa conversa animada. Acabaram falando sobre trabalho, já que Helen tinha vindo terminar sua jornada de palestras ali em Paris. Ela ficaria na cidade por um mês, descansando do longo trabalho que realizara e confessou sua vontade de procurar trabalho como professora nas diversas universidades francesas.
– Gosto das escavações e do trabalho de campo, mas sempre quis me dedicar à carreira acadêmica. Acho que já tenho conhecimentos e experiência suficientes para isso.
– Pois eu tenho certeza disso, Helen! Eu sempre disse a você que Paris lhe daria muitas oportunidades. – Françoise comentou.
– Fran tem razão, Helen. As universidades francesas sempre foram abertas a profissionais do mundo todo. E você tem um curriculum excelente. Conseguirá aulas com facilidade. – Julianne concordou, brigando intimamente com a satisfação em saber que ela pretendia ficar na França.
Aquelas sensações estavam irritando-a. A cada vez que Helen olhava para ela, tinha que afastar do pensamento o desejo de estarem ali sozinhas, apesar da ótima companhia de Fran e Babi. Sentia raiva de si própria, pois a maciez da voz de Helen parecia anestesia-la e ela não conseguia controlar suas vontades.
Quando o pedido para o jantar chegou, ela sentiu-se aliviada, pois Françoise disparou a falar sobre a excelente cozinha do restaurante e por conseqüência todas ficaram caladas enquanto ela falava.
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Estavam quase terminando o jantar quando a conversa recaiu sobre os vinhos. Helen já sabia que Julianne era enóloga; Fran tinha lhe contado praticamente tudo que ela fazia, mas sentiu vontade de ouvi-la falar sobre seu trabalho. Ela tinha observado Julianne durante todo o jantar e estava cada vez mais fascinada por ela. Era uma mulher inteligente, forte, e a beleza dela estava deixando-a encantada.
Depois de ter perguntado detalhes da produção de vinhos, ela ficou ouvindo Julianne falar. Há muito tempo não desejava uma mulher com aquela intensidade. Seu mergulho no trabalho deixou-a avessa a envolvimentos, mas diante dos olhos estonteantes de Julianne ela se sentia enfeitiçada. Tinha percebido que ela também ficara atraída, mas sentia que ela estava rejeitando aquele desejo.
Fran lhe contara tudo sobre a grande decepção que Julianne passara há um ano, mas também dissera que ela estava resolvida a ficar sozinha por muito tempo. E agora que estava conhecendo a bela enóloga, não conseguia imagina-la sozinha.
“Qualquer mulher neste restaurante adoraria poder dizer que ela é sua namorada.” – Helen pensou, vendo Julianne conversar distraída com Bárbara.
Desviando o olhar, deu de cara com o sorriso vitorioso de Françoise. Ela ignorou suas faces vermelhas por ter sido flagrada e disse que ia ao toillette, chamando-a para ir junto.
Quando entraram, Françoise não conseguiu mais se conter:
– E então, minha querida amiga? Onde está aquele completo desinteresse que você demonstrou quando lhe falei de Julianne?
– Ora, Fran... eu não imaginava que ela era tão linda!
– E agora, o que me diz? – ela perguntou, cruzando os braços.
– Não acredito que ela está sozinha esse tempo todo!
– Pois acredite. Eu e Bárbara já tentamos diversas vezes, mas só agora ela resolveu abrir “um pouco” a guarda e vir conosco à sua palestra; com a condição de eu não forçar nada entre vocês.
– Mas eu percebi que ela também se sentiu atraída por mim!
– Helen, querida, ouça: Julianne foi muito ferida. Desde então ela dedica-se apenas aos pais e ao trabalho. Eu também percebi o interesse dela, mas sei que vai lutar contra isso. Se você está mesmo interessada nela, terá de ter um pouco de paciência.
– Não estou só atraída, Fran. Faz três horas que a conheço, mas já estou fascinada por ela!
– Mas você precisa ir com calma. Precisamos pensar em alguma coisa. Deixe comigo! – ela falou, com ar de quem resolveria tudo.
Voltaram para a mesa e conversaram por um bom tempo ainda.
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Olhando para o relógio e vendo que eram quase onze horas, Françoise levantou seu copo para um último brinde naquela noite:
– Meninas, um brinde a esse nosso encontro! E espero que seja apenas o primeiro nesse mês em que teremos Helen conosco!
Depois de brindarem, ela sentenciou:
– Agora espero que não se importem, mas acho melhor irmos embora. Ainda temos que levar Julianne para casa.
– Fran, não é necessário! Posso ir de taxi. – ela tentou protestar.
– Nem pensar! Nós a levaremos até seu prédio, não é, Babi?
– Claro! Imagine se você vai voltar para casa num taxi gelado!
Diante da decisão delas, Julianne apenas encolheu os ombros e deixou-se levar até seu apartamento. Seria mesmo ruim ir embora de taxi àquela hora.
Quando chegaram à portaria do prédio, Françoise começou a pôr em prática o que estava planejando:
– Você vai voltar para Reims amanhã, Juli?
– Vou, mas terei de estar de volta a Paris na segunda-feira. Tenho uma reunião com meu orientador.
– Certo. Dê um beijo em seus pais por nós.
– Pode deixar, eu darei. – e olhando para Helen, tentou falar o mais naturalmente possível, despedindo-se dela também: – Foi um prazer conhecê-la, Helen! Se precisar de mim para indica-la a alguém na faculdade é só pedir para Fran me ligar.
– Obrigada, Julianne! Pedirei sim. – Helen respondeu, surpresa com a oferta.
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Chegando ao apartamento, Julianne jogou-se em sua cama pensando em tudo que sentira naquela noite. Foi obrigada a reconhecer que sua decisão em ficar sozinha tinha ficado seriamente abalada ao conhecer Helen. Sentia todas as suas defesas caírem por terra apenas em lembrar dos gestos suaves que ela fazia ao conversar ou do tom de voz aveludado e sedutor.
“Meu Deus, não quero sentir isso! – pensou. Não quero me envolver de novo! Ela é maravilhosa, mas...”
Fazendo um esforço enorme para afastar aquela mulher de seus pensamentos, ela levantou-se e tirou as roupas pesadas, indo para o chuveiro. A água quente escorreu-lhe sobre o corpo e pareceu que ao menos momentaneamente, levou suas inquietações com ela.
Envolta num robe, ela enfiou-se sob os cobertores e ligou a tv, mas o sono demorou a vir. Tentou pensar nos pais que estavam esperando-a para o jantar no dia seguinte e resolveu que voltaria a Reims logo de manhã, para evitar que Fran ligasse e a convidasse para um dos prováveis passeios em que levaria Helen, para que ela conhecesse Paris.
Apesar de saber intimamente que adoraria estar com elas, estava decidida e pegou o telefone, ligando para o call-center da companhia aérea e reservando uma passagem. O vôo era curto e estaria em casa bem antes do almoço.
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No apartamento de Françoise e Bárbara, Helen estava inquieta. No quarto que suas amigas lhe reservaram ela desfez suas malas e tentava colocar suas coisas em ordem no armário enquanto as duas tagarelavam com ela.
Françoise não se continha, tanta era sua alegria em ver que Helen e Julianne não precisaram de mais que um encontro para lhe darem, mesmo que sem saber, a certeza de que estava certa ao intuir que elas se sentiriam atraídas uma pela outra:
– Eu disse a você, Babi! Quando elas se encontrassem aconteceria. Eu sentia isso!
– Está bem, amor. – Bárbara rendeu-se. – Você estava certa. Eu só não concordava com isso, mas vi que não usei minha intuição como você usou.
Olhando para as duas, Helen sorriu, entendendo porque se davam tão bem como Françoise havia contado.
Ela sentou-se pesadamente na cama que seria sua por um mês e sentiu seu corpo dolorido pelo ritmo acelerado que enfrentara nos últimos dias. Seu pensamento levou-a de novo ao momento em que apertara a mão de Julianne e a olhara diretamente nos olhos pela primeira vez. Era aquele o momento. Aquele que não esqueceria jamais, mesmo que nunca pudesse sentir sequer um leve toque dos lábios dela nos seus.
Estava fascinada; tinha de admitir. Julianne era linda, inteligente, doce e sedutora. Aqueles olhos azuis eram um convite irrecusável para mergulhar na paixão que se escondia por trás deles; que se negava a ser vivida. Precisava se aproximar dela, mas não sabia como.
Fran e Babi seriam o elo para isso, já que Julianne era amiga delas.
“E Fran disse que daria um jeito.” – ela lembrou-se.
Notando o silêncio dela, Bárbara interrompeu seus pensamentos:
– Espero que fique confortável aqui, Helen. Tentamos deixar o quarto de hóspedes o mais arrumado possível para você se sentir em casa.
– Oh, obrigada, Bárbara, mas não era no quarto que eu estava pensando.
– Humm... então deixe-me adivinhar em “quem” era... – Françoise provocou.
– Deixe de ser convencida, Fran! – Helen fingiu estar brava com ela, atirando-lhe um travesseiro.
– Eu realmente “estou” convencida. O que posso fazer se minha intuição é infalível?
– Ora, ora... em vez de ficar se gabando, porque não pensa em algo para me aproximar de sua maravilhosa amiga solitária?
– Não se preocupe. Se Juli não tivesse gostado de você, nem tentaríamos, mas... – ela fez uma pausa proposital.
– ... ela estará de volta na segunda-feira... e vocês se encontrarão “por acaso” na faculdade! – completou, com ar misterioso.
– Mas ela estará na Faculdade de Química; no departamento de Enologia. Que emprego uma arqueóloga estará procurando por lá? – Helen ainda não tinha entendido o pequeno plano de Françoise.
– Minha querida, a Faculdade de História não fica longe dali. Logo, o departamento de Arqueologia também não. E você estará levemente perdida, conhecendo o campus despreocupadamente. Será uma enorme coincidência encontrar Julianne por lá, não acha?
– Fran, não vou fazer isso! É ridículo! É a forma de aproximação mais manjada que conheço!
– Não importa, Helen. Ela tem que conhecer você; começar a confiar de novo em alguém. Eu e Babi podemos fazer convites para sairmos juntas, ajudando a se aproximarem, mas isso você terá de fazer sozinha.
Fran tinha razão.
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Depois de terem levado Helen para conhecer vários lugares no final de semana, na segunda-feira Françoise ligou logo cedo para o departamento de Enologia e conseguiu a informação de que o orientador de Julianne estaria lá apenas no começo da tarde e que ela tinha uma reunião marcada com ele.
Como depois do almoço ela e Bárbara tinham compromissos na faculdade, resolveram almoçar lá mesmo e depois deixarem Helen se encarregar do resto. Se ela queria mesmo se aproximar de Julianne, aquela seria sua chance.
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Seguindo as indicações de Bárbara, Helen procurou pela biblioteca do departamento e ficou lá por algum tempo. Depois de folhear algumas revistas, saiu pelos corredores, observando a bela arquitetura do prédio. Se não fosse o motivo que a levara ali, ela sem dúvida passaria um bom tempo admirando aquelas construções seculares.
Já tinha visto todo o lugar e estava preocupada, pois os ponteiros do relógio mostravam que as horas estavam passando e Julianne não aparecia. Estava próxima ao corredor onde ficava a sala do orientador dela e parou distraidamente em frente a um painel e ficou lendo alguns cartazes que falavam sobre congressos. Ela olhou novamente para o relógio e já estava decidindo ir embora quando ouviu passos elegantes se aproximarem devagar e a voz doce de Julianne chama-la:
– Helen?
Helen não resistiu e antes de se virar, fechou os olhos por um instante, sentindo o perfume que chegou antes mesmo que ela.
– Oh, olá, Julianne!
– Veio conversar com alguém sobre trabalho? – Julianne perguntou, lutando para disfarçar o quanto tinha ficado feliz em encontra-la.
– Sim, eu almocei com as meninas e estive na Faculdade de História, no departamento de Arqueologia, falando com algumas pessoas. Depois resolvi conhecer o campus sozinha, já que elas tinham de trabalhar.
Por um momento ficaram em silêncio, sentindo o constrangimento de não saberem direito o que falar. Helen sentia as pernas tremerem; a presença de Julianne deixava-a sem reação.
Num ímpeto disse:
– Quer tomar um chá comigo? Estou andando há um bom tempo e gostaria de me sentar um pouco.
Julianne não esperava pelo convite. Tinha acabado uma conversa de mais de duas horas com seu orientador, discutindo detalhes de sua pesquisa e também estava precisando relaxar um pouco. Pensou em como seria agradável passar um final de tarde na companhia de Helen e sem pensar decidiu leva-la ao Café Jussieu. Era um lugar aconchegante e seria delicioso conversar com ela tomando seu expresso.
Ela sentia que suas resistências caiam mais e mais a cada palavra que trocava com Helen; e obrigou-se a não pensar em nada além de desfrutar da presença dela sem entrar em conflito; pelo menos por aquelas próximas horas.
– Seria muito bom, Helen! – ela respondeu. – Mas não vamos ao restaurante da faculdade. Se você aceitar o convite, gostaria de leva-la a um dos meus lugares preferidos em Paris!
– Um Café? – ela perguntou, radiante por Julianne ter aceitado o convite.
– Sim, o Café Jussieu. Fica na Place des Vosges e tem uma vista linda do segundo piso. Fica no mesmo bairro onde fomos jantar na sexta-feira, mas como era noite, agora você o verá com outros olhos.
– Bem... vamos lá então!
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A tarde estava perfeita para se ficar olhando a vista que o Café proporcionava das mesas coladas às imensas janelas de vidro do segundo piso. O sol tentava uma aparição tímida, querendo diminuir um pouco o frio. Julianne escolheu a melhor mesa do salão, para que Helen pudesse ver a paisagem e ao mesmo tempo saborear o clima alegre que reinava.
– Está gostando de Paris? – perguntou.
– Muito! – Helen respondeu com entusiasmo. – No final de semana, Fran e Babi me levaram a vários lugares lindíssimos: museus, restaurantes, bairr&iaííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííute;s típicos com construções maravilhosas! Subi até o último patamar permitido na Torre Eiffel; fomos à igreja de Notre-Dame, à Basílica de Sacré-Coeur, ao Louvre, ao Museu d’Orsay; enfim, a todos os lugares mais lindos de Paris!
– Se você ficar definitivamente, seria bom que conhecesse o interior do país: castelos,&iaííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííute;vinícolas. Modéstia à parte, nosso país é belíssimo. – Julianne sugeriu.
– Ah, eu farei isso, sem dúvida! Devem existir plantações que os turistas podem visitar, ver a produção, não? Depois que você me falou sobre seu trabalho, fiquei curiosa sobre a produção de vinhos.
Quando ela percebeu já havia falado. O silêncio demorado de Julianne ao responder, fez Helen pensar que havia falado demais, mas ela não viu no rosto dela um único sinal disso.
– Oh, eu apenas segui a profissão que quase todos da minha família seguiram nos últimos dois séculos.
Nesse momento a garçonete chegou com os cardápios e como Helen não conhecia as bebidas da casa, Julianne sugeriu um cappuccino, que lhe pareceu ser mais do gosto dela.
A garçonete se afastou com os pedidos e quando Julianne voltou-se novamente para Helen, sentiu seu rosto queimar ao se deparar com os olhos dela. Um frio intenso percorreu-lhe as costas, enquanto seus olhos não conseguiam se desviar. Queria falar alguma coisa, mas sua boca negava-se a pronunciar qualquer palavra.
Num esforço sobre-humano, ela virou o rosto para a janela, olhando a praça movimentada lá embaixo e tentando disfarçar seu constrangimento.
Ela lutava contra a vontade de acariciar aquele rosto de pele aveludada e lembrou-se que decidira não pensar em seus conflitos, mas era uma decisão quase inútil diante do que sentia.
“Meu Deus, estou me apaixonando por ela!” – pensou.
– Você não respondeu.
– Hãã... como? – a voz de Helen tirou-a de seus pensamentos.
– Você não respondeu se existem vinícolas que recebem turistas; onde se poderia ver a produção de vinho.
– Oh, desculpe Helen! – ela respondeu, sentindo seu rosto ficar vermelho. – Sim, existem esses locais por toda a França.
A conversa rumou para os vinhos novamente e elas conversaram demoradamente sobre os muitos lugares que Helen poderia conhecer. Mesmo sem ter certeza se ficaria definitivamente naquele país, ela queria aproveitar ao máximo seus poucos dias de férias. Sua vontade era convidar Julianne para acompanha-la, viajar com ela pelos mais belos recantos franceses, mesmo que fosse apenas como amigas.
Por várias vezes teve de conter o ímpeto de tocar a mão dela que estava ali, pousada na mesa, a poucos centímetros da sua. Seu coração parecia descontrolado a cada vez que imaginava como seria o toque daquela mulher. A cada momento que passava ao lado dela, Helen a queria mais. Sentia que estava se entregando a uma paixão, um amor de verdade, e não apenas sentindo uma atração que poderia ser saciada numa noite.
“Não! Não é só isso! – pensou, enquanto ouvia Julianne falar. Quero faze-la feliz; arrancar essa mágoa que a impede de amar de novo!”
Incrédula consigo mesma, Helen reconheceu que depois de tanto tempo sozinha, havia se permitido apaixonar em apenas alguns dias. A mulher mais linda que já conhecera estava diante dela, fazendo seu coração entregar-se ao amor que tinha acreditado não ser mais necessário na sua vida. Julianne não tinha feito nada para isso; ela reconhecia. Bem ao contrário. Mas Helen agora sabia que não era preciso mais do que algumas horas na companhia dela para que isso acontecesse.
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O tempo passou rapidamente e quando viram já estava escurecendo.
Julianne fez questão de pagar a conta, argumentando que o convite para virem ao Café tinha sido dela. Helen sorriu, aceitando a gentileza.
– Ok, mas da próxima vez eu pago!
– Está certo: você paga! – Julianne concordou, tentando disfarçar o fascínio que aquele sorriso despertava nela.
Sentia seu corpo vibrar por dentro todas as vezes que Helen lhe sorria daquela maneira tão doce e ao mesmo tempo sedutora. Ela não fazia por querer, apenas era assim; e Julianne percebeu que não queria leva-la até a casa de Fran e Babi, deixa-la na porta e se despedir. Queria ficar mais tempo com ela, conversando, rindo, e principalmente vivendo.
Era isso! Sentia-se viva ao lado de Helen! Sentia desejo; sentia vontade de fazer amor com ela a cada gesto que ela desenhava no ar com as mãos delicadas. Mas aquele medo ainda estava ali! Aquele maldito medo que ficou trancado em seu coração desde que viu aquelas fotos; desde que bateu a porta e saiu da vida de Claire, enterrando a sua própria numa solidão voluntária.
Quando saíram para a rua, indo em direção ao carro, Julianne respirou fundo, tentando fazer com que o ar frio reforçasse suas convicções já tão abaladas pela jovem arqueóloga que caminhava ao seu lado.
Entraram no carro e ela puxou o cinto de segurança até a trava automaticamente, tocando sem querer a mão de Helen que fazia a mesma coisa. Uma onda de calor se formou naquele toque tão simples e bobo, fazendo seu corpo retesar-se inteiro e seu coração parecer que saltaria do peito. Olhou para Helen e viu que tinha acontecido o mesmo com ela. As mãos que ainda se tocavam se afastaram num constrangimento inegável.
Helen viu aquele rosto assustado e não se segurou mais: levou a mão ao rosto de Julianne e num impulso, pediu baixinho:
– Julianne, por favor... não tenha medo de mim. Sei o que está sentindo; posso ver nos seus olhos. Você também vê nos meus. Não podemos negar isso! – ela falou, trêmula.
– Helen, eu...
Sem esperar mais, ela tomou o rosto de Julianne entre as mãos e beijou-a com ardor, desejando que ela soubesse o quanto a queria no toque de seus lábios sobre os dela.
Como se fosse perder os sentidos, Julianne segurou com força as mãos de Helen em seu rosto, abrindo seus lábios e entregando-se àquele beijo. Sentia seu coração disparado enquanto seu corpo recebia de volta todo o desejo apagado pela traição.
Ela percebeu o interior de suas pernas molhar-se como há muito não acontecia, atiçado pela boca colada à sua. Helen sugava seus lábios devagar, passando a língua com toda delicadeza do mundo. Seus corpos se procuraram, querendo com urgência a aproximação, o toque mais íntimo.
Julianne deixou sua vontade falar mais alto: queria Helen, queria a pele daquela mulher roçando a sua, o calor daquele corpo no seu. Sentiu seus desejos mais vivos quando a mão dela entrou pelo casaco aberto e puxou sua cintura para mais perto. Os lábios dela deixaram sua boca e desceram lentamente pelo pescoço, fazendo-a gemer baixinho.
Com a respiração entrecortada pelo desejo que lhe tomava todo o corpo, Helen sentiu as mãos de Julianne afundarem entre seus cabelos e puxarem-na para si. Ela não conseguia acreditar que tinha Julianne em seus braços, entregando-se por inteiro.
Sedentas uma pela outra, elas percebiam o fogo que se apossava delas, deixando-as sem fôlego dentro daquele pequeno espaço. Afastando-se de Julianne com esforço, Helen pediu, olhando-a nos olhos:
– Querida, leve-me para sua casa. Eu quero...
Sem deixar que ela terminasse a frase, Julianne beijou-a novamente, numa resposta silenciosa e intensa àquele pedido. Não negaria isso. Nem a Helen e nem a ela própria.
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Julianne dirigiu por quinze minutos até seu apartamento com Helen agarrada a ela. Subiram ansiosas, e quando chegaram ao quarto, beijando-se com urgência, as roupas foram ficando uma a uma pelo chão. Tinham urgência de se tocarem com mais intimidade, querendo que o embaraço inicial que sentiam por nunca terem estado juntas se esvaísse rapidamente. Nuas&iaííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííute; caíram sobre a cama, e Helen rolou sobre Julianne devagar, colocando-se entre as pernas dela. Aquele corpo deixava-a enlouquecida de desejo, fazendo-a sentir a excitação contrair sua intimidade e molha-la toda.
A maciez dos pêlos uniu-se em um único contato, roçando lentamente até que cada uma sentiu a umidade da outra. Naquele entrelace de pernas, os sexos latejantes de esfregaram na excitação urgente que as bocas unidas ajudavam a incendiar. Helen movia seu quadril colado ao de Julianne, entorpecida com o cheiro feminino que já preenchia o quarto. Rolaram na cama, envoltas numa aura de calor e desejo que afastava o frio das peles nuas.
Helen desceu a boca até os seios rijos de Julianne, sugando a pele rosada com vontade, sentindo a suavidade da pele ser substituída por arrepios de prazer. Tocou levemente com&iaíííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííute;a língua os bicos endurecidos para em seguida beija-los sem pressa.
Julianne entregou-se sem restrições. Sua vontade de ser amada novamente afastava qualquer medo que pudesse sentir. Os carinhos de Helen traziam-lhe de volta todo o prazer de fazer amor com uma mulher.
E quando os dedos dela entraram em seu sexo excitado, ela gemeu forte, agarrando-se às costas de Helen, mostrando que queria ser dela. Num movimento involuntário, seu corpo seguiu o ritmo daquela mão que a penetrava, e quando percebeu, sentiu a língua de Helen substituindo seus dedos.
– Oh, querida... assim... – ela murmurou, não resistindo mais.
Sua excitação não permitiu que Helen a sugasse por muito tempo. Sentindo a língua dela explorando-a com avidez; sugando toda sua feminilidade, Julianne sentiu uma onda de prazer crescendo dentro dela. Quando Helen sugou-a com mais força, ela ergueu o corpo em direção àquela boca, deixando que a onda a arrebatasse e a levasse aos céus. Com as mãos entrelaçadas às de Helen, ela sentiu o gozo apoderar-se dela, fazendo-a gritar:
– Helen!
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Inesperadamente para Helen, Julianne não ficou inerte depois do prazer que deixou seu corpo entregue a ela. Com a linda arqueóloga ainda entre suas pernas, ela levantou o corpo e tomou o rosto dela em suas mãos, puxando-a para cima dela e beijando-a com ansiedade.
Olhando para Helen com paixão, Julianne acariciou aquele rosto levemente queimado de sol, enquanto suas mãos desciam pelas costas dela.
– Agora eu quero seu gosto para mim... – ela sussurrou no ouvido de Helen, enlouquecida pela excitação dela que lhe molhava a perna.
Deixando-se levar pelo caminho de fogo que os lábios de Julianne lhe traçaram na pele, Helen agarrou-se a ela e as duas rolaram na cama tomadas novamente por um desejo enlouquecido. Os sexos enroscados e úmidos de prazer procuravam-se ansiosos e Helen arqueou o corpo o mais que pôde quando sentiu a boca de Julianne em sua virilha, mordiscando de leve a pele lisa que logo ficava coberta de pêlos macios.
Com as pernas sobre as costas de Julianne, ela entregou-se completamente, sentindo a boca dela entrar por entre os pêlos curtos e tomar seu pequeno ponto excitado e rijo entre os lábios. Quando Julianne entrou com a língua em sua intimidade, ela só sentiu seu sexo explodir inesperadamente, deixando seu corpo ser sacudido por um espasmo e preenchido do mais puro prazer.
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Inertes sobre a cama, elas abraçaram-se cheias de amor, sentindo o sono chegar quase que imediatamente depois de se amarem com toda aquela força. Mas antes de adormecerem completamente, Helen recebeu o mais doce presente que Julianne poderia lhe dar:
– Querida? – ela chamou.
– O que foi, amor?
– Eu não tenho mais medo de você... nem do que sentimos.
Olhando-a cheia de carinho, Helen beijou-a de leve, perdendo-se naquele azul límpido e claro dos olhos dela.
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O toque inesperado do telefone ao lado da cama acordou Julianne. Ela estendeu a mão para atender enquanto Helen também acordava e lhe dava o mais lindo sorriso que já tinha visto.
– Alô?
– E então? Quando será o casamento?
– Fran? – Julianne exclamou pulando com o susto que levou ao ouvir a voz da amiga do outro lado da linha.
– Desculpe, mas não resisti! Como já são onze da noite e Helen não aparecia, achei que só “acordaria” vocês, sem interromper mais nada. Eu queria me certificar de que Helen estava com você e não sozinha por aí. – ela falou, com a voz alegre de sempre.
– Oh, Fran... desculpe... nós...
– Eu sei, querida. Eu é que peço desculpas. Bárbara e eu estamos felicíssimas por vocês estarem bem. Durmam; amanhã nos encontramos e você nos devolve nossa amiga! – ela brincou.
– Claro, claro! – Julianne respondeu, ainda confusa. – Eu ligo para vocês.
Ela desligou o telefone e olhou para Helen encostada em seu peito. Com a mão agora desocupada, ela acariciou aquele rosto perfeito e beijou-a com carinho, sem tirar os olhos dela.
– Parece que conheço você há anos! – Helen murmurou, parecendo incrédula com as próprias palavras.
Julianne se levantou, mas continuou bem perto de Helen, olhando-a com toda a ternura que se possa imaginar. Aquela mulher tinha mudado sua vida em poucas horas e seu coração já não era mais o mesmo. Num impulso beijou-a com ansiedade, puxando-a para si e sentindo a felicidade em sentir que ela arrepiava-se com aquele toque. Se fosse preciso esconderem seus desejos, a pele e os olhos de ambas seriam seus maiores inimigos naquela hora. A respiração entrecortada de Julianne parecia querer fazer com que seu peito explodisse a qualquer momento. Não podia mais negar tudo aquilo. Sua alma, seu corpo, seu coração e sua vida agora pertenciam a Helen. E era de um jeito que jamais tinha sido com qualquer outra mulher!
Com as mãos trêmulas ela tocou de leve os lábios de Helen, para beija-los vezes seguidas, enquanto repetia:
– Eu te amo, Helen! Te amo... te amo... não consigo mais negar isso! Estou apaixonada! Nunca me senti assim; não dessa maneira.
Espantada com o que saía de sua própria boca, Julianne abraçou-se a Helen como quem abraça algo que não se quer perder jamais. Seu coração disparava descontrolado, enquanto seus olhos marejavam de leve, fazendo um pequeno nó subir até sua garganta. Aquele instante mágico encheu seu coração de alegria pelo que significava: o ferimento estava cicatrizado! Parecia um sonho, mas estava verdadeiramente se entregando ao amor que tinha entrado em sua vida poucos dias atrás.
Helen só conseguiu sentir um frio incalculável percorrer seu corpo antes de se agarrar a Julianne. Apertou-a contra seu coração descompassado e repleto de felicidade pelo que tinha acabado de ouvir. Com as mãos tremendo pelo nervosismo, ela puxou de leve aquele rosto lindo para junto do dela, enquanto seus olhos procuravam os de Julianne para lhe dizer o que sentia:
– Eu também a amo, querida! Fran tinha me falado de você, mas até eu vê-la pela primeira vez eu não... eu não imaginava que me apaixonaria assim!
Julianne abraçou-a como se quisesse molda-la ao seu corpo; queria perpetuar aquela alegria por todos os dias que ainda viriam.
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O dia claro encontrou as duas mulheres dormindo tranqüilamente e enroscadas uma na outra. Helen abriu os olhos sonolentos e ficou olhando Julianne que ainda dormia. Ela ainda não acreditava direito no que havia lhe acontecido em tão pouco tempo. Parecia que acordaria de um sonho lindo a qualquer momento, mas quando Julianne se mexeu, acordando e sorrindo para ela, teve certeza de que aquilo tudo não era sonho.
– Bom dia!
– Oi, bom dia. – Julianne respondeu, espreguiçando-se para beija-la em seguida, perguntando:
– Está com fome, meu amor?
– Morrendo! – Helen respondeu, rindo do próprio exagero.
– Então vamos tomar um banho rápido e depois tomar um bom café.
– Tem certeza que vai ser rápido? – ela perguntou com os olhos maliciosos.
– Humm... não, mas já sei: você vai tomar banho e eu arrumo a mesa do café para nós. – Julianne respondeu beijando-a com carinho e levantando-se rapidamente da cama antes que Helen a agarrasse de novo. Vestiu um robe para poder ir até a cozinha, mas antes deu outro a Helen e mostrou a ela o banheiro e onde ficavam as toalhas.
Enquanto mexia na geladeira para ver o que serviria para sua querida, Julianne parou por um momento, percebendo o quanto estava feliz. Lembrou-se de cada detalhe do que aconteceu desde o momento em que a encontrou no corredor da faculdade.
“Ela me trouxe de volta à vida!” – pensou, feliz.
Nesse momento o telefone tocou. Achando que era Fran de novo, resolveu falar direto:
– Está certo, vou leva-la de volta depois de tomarmos o café...
– Julianne, é você, filha? – era a voz da mãe dela do outro lado da linha.
– Mamã? Oh, desculpe, eu pensei... – ela gaguejou enquanto seu rosto ficava mais vermelho do que a maçã que tinha na mão.
– ... que era Fran. Não se preocupe, querida, pois acabo de perceber na sua voz uma felicidade que há muito tempo não sentia. Fico muito feliz por Françoise ter acertado sobre essa moça, e mais feliz ainda em saber que vocês de deram bem.
– Oh, mamã... você é tão maravilhosa!
– Obrigada, filha. Mas pelo que vejo essa moça também é. Qual é o nome dela?
– Helen. Helen Adler-Wright.
– Você ficou de voltar para casa ontem à tarde; porque não a trás com você quando vir? Gostaria de conhece-la.
– Está falando sério, mamã? Ainda ontem sugeri a ela que conhecesse algumas vinícolas do interior, mas não foi exatamente a nossa que falei.
– Pois poderá ser a nossa. Até onde eu sei é uma das melhores da França, não é? – Geraldine falou, rindo.
– Sempre achei isso! – Julianne concordou, sem nenhuma modéstia.
– Então convide-a, querida. Se ela quiser nos conhecer, eu e seu pai ficaremos muito felizes!
– Obrigada, mamã! Vou falar com ela. Dê um beijo no papá por mim.
– Darei, querida. Até mais. – e desligou.
Julianne colocou o fone no gancho e ficou parada, sentindo seu coração cheio de alegria com o que sua mãe fizera. Ela sempre fora sua grande amiga e em todos os momentos de sua vida esteve do seu lado. Preconceito era algo que nunca atingira a personalidade generosa de Geraldine de Laet. Quando Julianne descobriu-se gay, sua mãe foi a primeira a saber, mas quando ela decidiu se casar com Claire, ela deixou claro que não concordava. Ela foi ao casamento, esteve ao lado de Julianne o tempo todo, mas não gostava de Claire, tratando-a apenas com educação. Em sua intuição de mãe, parecia antever o que ela faria dois anos depois.
Distraída com esses pensamentos, Julianne não viu que Helen estava encostada na porta, já vestida e com os cabelos molhados.
– Agora é sua vez. – falou, mostrando um sorriso delicioso.
Julianne foi até ela e envolveu-a em seus braços, levando-a para a mesa já posta com o café.
– Depois eu tomo um banho, meu amor. Sei que está com fome e não vou faze-la esperar.
– É, realmente estou morrendo de fome! – Helen concordou.
Elas comeram e conversaram como se fizessem parte da vida uma da outra há muito, muito tempo. E Julianne ainda não conseguia acreditar que se entregara daquele jeito. Alguns dias atrás nem queria conhecer Helen e agora tomava o café da manhã com ela depois de terem se amado com loucura. Parecia irreal, como se aquelas cenas fizessem parte de um filme e não da sua realidade. Via e ouvia Helen com um entusiasmo que não se lembrava de ter sentido algum dia. Sentia como se ela fosse agora, uma extensão do seu corpo, dos seus próprios pensamentos. Helen era parte dela.
Quando estavam quase terminando, Julianne falou a ela sobre o convite de sua mãe:
– Helen, quando você chegou do banho, eu tinha acabado de falar com minha mãe. Ela convidou você para conhecer nossa vinícola.
– Mas... sua mãe sabe que estou aqui?– ela perguntou, surpresa.
– É que dei um fora ao atender, pensando que era Fran. – Julianne enrubesceu ao falar.
– E ela me convidou para ir à vinícola? Então ela sabe...
– Sim, querida, sempre soube. Minha mãe é uma criatura maravilhosa; sempre me entendeu e aceitou, sem qualquer traço de preconceito. Só não aprovava Claire. Quando disse a ela que viria a Paris a convite de Fran e Babi e contei que elas queriam me apresentar você, ela simplesmente me perguntou porque eu não me permitia conhece-la, já que minhas melhores amigas estavam fazendo um esforço enorme para isso.
– Sua mãe fez isso? – Helen estava pasma com o que ouvia.
– Fez.
– Sem nem ao menos ter me visto uma única vez?
– Ela confia nas meninas; e acho que o convite foi por isso mesmo. Ela não vai submeter você a uma prova para saber se pode ser minha namorada, mas sei que ficou curiosa sobre você ao saber que estamos juntas e quer conhecer a mulher que está trazendo a felicidade de volta para minha vida.
– Hummm, gostei disso. – Helen murmurou com um jeito malicioso.
– Do convite?
– Também, e me sinto muito feliz e honrada com ele. Mas também por você dizer que sou sua namorada. – ela completou, debruçando sobre a mesa e beijando Julianne de leve.
– Eh... bem eu... nem perguntei se você quer, não é? – Julianne desculpou-se, achando que tinha se adiantado demais.
Helen levantou-se e contornou a mesa, ajoelhando-se ao lado de Julianne. Pegou as mãos dela e levou-as aos lábios, fechando os olhos ao mesmo tempo, como que para sentir por inteiro e maciez daquela pele. Olhou para ela com os olhos cheios de ternura e amor.
– Julianne, não importa o que “eu” quero e sim o que “você” quer. Não sei detalhadamente o que você passou, mas me sinto a mulher mais privilegiada do mundo, pois estou aqui com você; depois de termos feito amor; depois de termos dormido abraçadas e de você ter me acordado com um beijo apaixonado. Tudo isso aconteceu em poucos dias e você não se fechou. Até tentou, mas por alguma bênção do céu, deixou que seu coração falasse mais alto que qualquer outra coisa. E eu me apaixonei assim que a vi pela primeira vez. Eu quero tudo de você; quero ser sua namorada, sua mulher; quero ser parte de você como sinto que você é parte de mim. Estou absolutamente apaixonada e se você estiver também, serei a mulher mais feliz que existe.
Olhando para ela com os olhos marejados, Julianne não conseguiu se conter; aproveitando que Helen estava ajoelhada, pegou-a no colo e levou-a para o quarto. Seu coração apertava-se no peito de amor e desejo por Helen e quando colocou-a na cama, sentiu o fogo que incendiou-se à volta delas. Helen correspondeu com ardor ao desejo de sua amada e enroscou-se nela.
Julianne foi beijando bem devagar aquele corpo macio; com a boca e a língua, foi tocando Helen, deixando-a à mercê de seus carinhos. Beijou sem nenhuma pressa o pequeno lóbulo da orelha dela, chamando-a para se amarem. Percorreu a nuca coberta de pêlos dourados, fazendo seus seios deslizarem pelas costas dela até ficarem duros e fazerem Helen arrepiar-se toda com o toque deles. Abraçada a ela por trás, Julianne movimentava seu quadril bem junto ao de Helen, enquanto suas mãos abriam devagar o sexo dela para encontrar aquela umidade quente e latejante que a deixava em êxtase.
Helen sentia Julianne em suas costas e as mãos dela entre suas pernas lhe arrancavam gemidos altos, cheios de desejo e que ela não conseguia controlar:
– Oh, Juli... mais querida, mais...
Deslizando seus dedos sem pressa por aqueles pêlos molhados, Julianne sentiu os seus próprios se encharcarem, e a vontade de possuir Helen tornar-se cada vez mais forte.
Ela não estava mais conseguindo esperar e então virou sua mulher devagar, até que Helen ficou de frente para ela. Com ela ainda deitada de lado, Julianne desceu seu corpo até ficar entre as pernas dela. Sentindo os pêlos molhados em seus lábios, ela tomou Helen em sua boca, invadindo-a e sugando-a com toda calma. Queria que Helen explodisse demoradamente, fazendo-a sua.
Sussurrando o nome de sua mulher, Helen deu-se toda para Julianne. Deixou-se lamber e sugar até que não conseguiu mais adiar os espasmos que subiam do ponto onde Julianne a fazia mulher e se espalharam por todo seu corpo.
– Juli! Oh, amor! Continue... por favor... eu vou...
Com uma das pernas nas costas de Julianne, ela puxou-a mais contra si e só conseguiu arquear o corpo para trás e entregar-se ao longo prazer que explodiu em seu sexo.
Julianne esperou que as longas contrações de prazer diminuíssem para só depois subir o corpo e aconchegar Helen em seus braços. Sentia o coração dela ainda batendo forte, quando ela se virou e lhe presenteou com todo o amor possível de se sentir, espelhado naqueles olhos &iaíííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííííute;ncríveis.
– Julianne, eu a amo! Você sabe disso, não sabe?
– Claro que sei, meu amor! Não tenha medo disso, está bem? “Eu” não tenho mais medo; e não quero que você tenha. Eu amo você mais que tudo! Você é minha vida agora!
Elas se beijaram, e Julianne só conseguiu perceber a delícia do peso de Helen sobre ela novamente. Nem pensou em protestar quando a boca dela desceu por seu pescoço e chegou aos bicos enrijecidos. Deixou que Helen os prendessem delicadamente entre os dentes, enquanto a dor leve da mordida se juntava à contração entre suas pernas que pedia a boca de sua mulher.
Deleitando-se naquele abdômen duro, Helen desceu primeiro uma das mãos, até encontrar o triângulo escuro que ansiava por ser saboreado. Propositalmente, foi com a boca até tocar com a língua o ponto já intumescido de desejo, para se afastar em seguida e ouvir o gemido que arrancava de Julianne:
– Helen, por favor, querida... não posso esperar...
Sem querer tortura-la mais, Helen afastou os pêlos bem cortados e mergulhou os lábios de encontro à essência da mulher que se dava toda para ela. Sugou-a com vontade, invadiu-a com força, acariciou com a boca e a língua toda aquela carne excitada até fazê-la estremecer inteira com um gozo prolongado e inebriante.
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Da janela do avião, Julianne mostrava a Helen as belas colinas de Reims que se aproximavam devagar. Era terça de manhã e elas ainda riam das caras de espanto e de felicidade que Françoise e Bárbara não conseguiram disfarçar quando se encontraram com elas na segunda à tarde. As quatro amigas acabaram por jantar juntas novamente, já que Fran não daria sossego enquanto não soubesse de todos os detalhes.
Agora estavam indo atender ao convite da mãe de Julianne e Helen sentia um pouco o nervosismo da situação mexer com ela. Lembrava-se a toda hora que Julianne havia dito que Geraldine nunca gostou de Claire e inevitavelmente tinha medo de que acontecesse o mesmo com ela. Era tanta coisa nova acontecendo em sua vida que estava demorando para se acostumar, mas olhava Julianne a seu lado e o sorriso dela fazia-a estremecer como se fosse a primeira vez que o via.
Ao desembarcar, Julianne acenou para um rapaz louro que esperava no saguão. Era Jean, e ele viera busca-las. Ele sorriu com simpatia e cumprimentou Helen.
Nos quarenta minutos que rodaram até chegaram à vinícola, Helen ouviu Julianne contar uma pequena história sobre cada uma por onde passavam. Aquela região era simplesmente maravilhosa aos olhos iniciantes de Helen; aquelas plantações de uva a perder de vista deixavam-na boquiaberta.
Quando estavam chegando, Julianne apontou para uma construção de pedra sobre a colina mais alta:
– Helen, aquele é o pequeno castelo que sedia a vinha. E também é minha casa aqui em Reims. – Julianne explicou, apontando para o castelo que aparecia entre a vegetação da estrada.
– Oh, Julianne! É lindíssimo! – ela exclamou, surpresa.
Quando o carro se aproximou mais, Helen viu uma senhora quase tão alta quanto Julianne parada à entrada da construção. Nem foi preciso que Julianne lhe dissesse que aquela era sua mãe. Com os cabelos apenas um pouco mais claros que os dela e com os mesmos olhos azuis, isso não foi necessário.
Ao descerem, Geraldine abraçou demoradamente a filha para então estender sua mão à Helen, enquanto abria um sorriso.
– Mamã, esta é Helen Adler-Wright. Helen, Esta é minha mãe, Geraldine de Laet. – Julianne apresentou-as.
– Seja bem-vinda à Maison de Laet, minha querida. – Geraldine respondeu, segurando a mão de Helen cordialmente com ambas as mãos.
– Obrigada pelo convite, Madame de Laet. É uma honra estar aqui. – Helen falou enquanto apertava as mãos dela ainda com um pouco de timidez.
– Não precisa me chamar de “madame”, ma cherie. Fico contente apenas com Geraldine. – ela falou carinhosamente. –Desculpe por meu marido não estar aqui para recebe-las, mas ele precisou verificar um lote que será entregue hoje.
– Não tem problema, mamã. Depois Helen poderá conhece-lo. – Julianne adiantou-se
– Então vamos entrar. Jean levará as malas de vocês. – ela falou, enquanto empurrava as duas gentilmente para dentro.
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Dentro do castelo, enquanto Julianne e sua mãe a conduziam por corredores e salões, Helen ficava cada vez mais encantada. Estava acostumada com construções antigas, mas nada tão imponente quanto um castelo francês do século XVII.
A mãe de Julianne levou-as à sala de jantar onde um farto café da manhã esperava por elas. Ela tinha a mesma qualidade encantadora de Julianne: deixava todos à sua volta muito à vontade. Helen percebeu isso logo nos primeiros instantes de conversa, onde ela quis saber detalhes sobre o trabalho de Helen.
– Ao contrário de meu marido e minha filha, me interesso muito por arqueologia, Helen.
– Foi assim que comecei, Geraldine. Desde criança já adorava pirâmides, múmias e qualquer coisa que tivesse a ver com arqueologia. – Helen respondeu.
Já tinham terminado o café quando o pai de Julianne entrou. Era um homem muito alto; e os cabelos um pouco grisalhos não chegavam a esconder a beleza que ainda conservava. Ao olhar para ele, Helen reconheceu imediatamente aquele mesmo rosto anguloso de Julianne.
“Ela é uma mistura belíssima dos dois.” – Helen pensou.
Ele sorriu gentilmente para Helen, enquanto a cumprimentava e em seguida, envolveu Julianne num abraço.
– Seja bem-vinda à nossa vinícola, Helen. – ele falou enquanto se sentava para tomar o café. – Eu e Geraldine estamos felizes por você ter aceitado acompanhar nossa filha até aqui.
– Obrigada, Monsieur Phillipe. Julianne me falou tanto daqui que não pude recusar o convite.
Helen realmente podia sentir no ar o quanto estava sendo bem-vinda. Ela olhou para Julianne, sentada diante dela do outro lado da mesa e viu nos olhos dela, o mesmo amor que vira quando se amaram na noite anterior. Geraldine e Phillipe estavam felizes pela filha, e verdadeiramente tinham gostado dela. Helen também sentia isso no olhar deles. Isso a fez sentir-se mais tranqüila e ao mesmo tempo grata. Amava Julianne e queria faze-la feliz; e o fato dos pais dela a aprovarem lhe permitia que tivesse mais certeza de que era capaz disso.
Ela já tinha deixado de lado o receio inicial que sentira, e as pequenas surpresas de ser bem recebida naquela família ainda não tinham terminado. O castelo não era gigantesco, mas tinha muitos quartos, todos reformados a ponto de fazer lembrar que se estava numa construção toda feita de pedras apenas por causa de algumas paredes que ainda as deixavam à mostra. A mãe de Julianne conduziu Helen ao quarto onde ficaria hospedada e qual não foi a surpresa dela ao ver que Geraldine havia instalado-a no quarto conjugado ao de Julianne. Helen tentou disfarçar o rubor em seu rosto, mas o sorriso de Julianne a deixou mais tranqüila.
Depois de praticamente exigir que Helen se sentisse à vontade como sua hóspede, Geraldine despediu-se dizendo que deixaria as duas descansarem um pouco.
Quando ela saiu, Julianne tomou as mãos de sua amada entre as suas e puxou-a para si, fazendo com que ela a abraçasse.
– Obrigada por ter vindo, amor. Estou muito feliz por você estar aqui. – ela falou, olhando para Helen com toda ternura possível.
– Eu é que estou feliz por estar aqui com você, Juli. Estou muito grata por seus pais estarem me recebendo tão bem. Vocês me fizeram lembrar da minha infância, quando meu pai ainda morava conosco e éramos tão unidos quanto sua família. É uma delícia para mim, estar de novo em uma ambiente tão aconchegante e cheio de amor.
– Então... seus pais se separaram? – Julianne ficou surpresa com a informação.
– Sim. Meu pai casou-se de novo e eu tenho uma irmãzinha de onze anos. Minha mãe ficou sozinha, mas gosta de aproveitar a aposentadoria recente para viajar com uma turma de amigas para todos os lugares que você puder imaginar. – ela respondeu rindo.
– Humm... filhas únicas costumam ser mimadas... – Julianne provocou, beijando-a enquanto a empurrava até a cama, fazendo-a cair deitada.
– ... e eu adoraria continuar sendo mimada por minha mulher!
– Farei isso com todo prazer! – Julianne respondeu começando a fazer cócegas nela, obrigando-a se contorcer toda para se defender.
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Ficaram ali conversando até a hora do almoço. E depois de terminarem o café com os pais de Julianne na imensa sacada da sala de jantar, ela levou Helen para conhecer de perto as plantações que se podia ver de lá. Foram até os galpões e adegas subterrâneos, onde Julianne trabalhava na classificação e controle de qualidade de cada safra. Helen ficou impressionada com aqueles salões escuros e repletos de barris de vinho e prateleiras com garrafas cobertas de poeira. Ouvia atentamente sua querida Julianne explicar-lhe todos os detalhes de como aqueles vinhos maravilhosos eram produzidos e envelhecidos e a grande dedicação e paciência que esse trabalho exigia.
Ela assistiu, deliciada, quando Julianne escolheu uma garrafa de champagne numa reserva que ela explicou ser produzida apenas para a família e abriu-a com um antigo sabre, à maneira de Napoleão, usando um só golpe no gargalo. Aquele foi o melhor champagne que Helen provou em toda sua vida.
Elas olhavam-se e ainda custavam a acreditar que tinham se apaixonado daquela forma. Aquele encanto todo, estampado nos olhos intensos e brilhantes deixavam-nas cada vez mais apaixonadas. Queriam fazer parte uma da outra e sentiam que tinham se encontrado definitivamente. No olhar de ambas, o que queimava era de uma força e de uma veracidade que chegava a doer. Na pele, a vontade que não se esgotava. Na boca a ânsia pelo beijo a toda hora; a vontade de tomar para si o gosto e a essência única da mulher que se ama. Nas mãos, a necessidade de tocar, de se deixar envolver pela umidade quente da intimidade feminina. Nos sexos a urgência do encontro, da união em uma única fêmea. Nos pensamentos, a convicção de ter encontrado a parte que faltava. No coração, a entrega absoluta e irrevogável de quem ama sem deixar nada para trás; sem jamais permitir que um instante sequer de amor passe despercebido.